Queridas graças, tudo de bom pra vocês, que quero dum amor tamanho quanto o ar. - ‘A estrela de Belém é hoje ainda numa noite escura…’ Dissipe-se ’ora, com o transluzir cimeiro à gruta, a vã angústia. - Quando o Reino de Deus chegar de vez, os padres ficarão desempregados, o Papa entreter-se-á um tempo imenso a fazer bolinhas de sabão. - O Cobrador das quotas do CCS há uns bons anos que a más horas chega indesejado. Das prestações dos últimos trimestres me crava em euros novos à socapa. Dava-me, entrementes, a costumado ioga espanhol. Retirado o bigodado gajo, em vão leito retomo, revoltando-me para outro lado. Ai de mim, que da urdidura o fio libérrimo não mais reato. - A rapariguinha do pub, entre copos solícita, amaro idílio nutre. - Tarefas com o Partido: Só quando desceu para ir à reunião, esperavam-no, deu conta de que enfiara, na hora, o pulôver americano. - Boi exausto os cornos investe a delir sonhos ideais. - Filha, que a Sírio tua fulja. - Então um muito bom dia com sol por aqui e com uma muito boa noite pela metade escura que agora está no outro lado alfinetada por mil pontinhos luas. - Pedrinhas da calçada por onde, solas gastas, sapatos a arrojos vão. Abrigam-se-me sob elas sumidas visões. - A fresca hora, Yolanda irrompe, apertando o cinto, p’lo Café. Um seu poema me pede, mas demoro-me a pari-lo pra papel, ruminante fatal duns versos múltiplos pra acertar contas a sorrisos. Se tanto a cansa se compor, porque não pernoita vestida na praceta, no aconchego das ignoradas estrelas? - Traseiras do Liceu, 4 da manhã: Como habitualmente, uns dois padeiros apartando pão em cestos, sacos, carrinhas. Mas eis que há novidade: Chegou o grande dia da viagem dos finalistas a Espanha. Uns madrugadores pais esperam já, mais seu menino, p’lo autopulman contratado. Mas o menino está nervoso e mal dormido. Desloca-se muito de um lado pra outro, não sabe que fazer dos pés. Mais pais, mais pais, mais pais e mais paizinhos, e mais meninos e meninas. Já não há onde arrumar mochilas, sacos e malinhas. Basbaques uns, e umas, outros, e outras, fumando, ou disfarçando pasmos com beijinhos. Boa antemanhã para o Joaquim guarda-nocturno: Se está entregue a praceta, pode por hoje ir mais cedo pra casa. - Com modorra vai o tempo. Alvuras tingindo dia. Preguiçosas ternuras avançando. - Alguém grita dentre silêncio; estores, seco estampido; a um carro na via algum cão ladra. - À sombra do companheiro no roxo ocaso, caída sobre rugosa terra, descansadinha, nutres com sonhos meus devaneios turvos, dás azo à música que soa p’lo ar nublado, és carne da loucura que me mantém. - Ignorado elo cambiante espera que se quebre verso? Som a remexer torpe ouvido? Melodia não transcrita? Correnteza extraordinária? Arrumador de tabacos na maquineta automática relata idos com manguchi independentista. - O escriba do olhar abrangente resolvera acabar letrinhas e abismar-se. - Nas mãos seguro, o livro a aluna lê, a resolver-nos. - A pomba do Santo ’Spríto voa-nos da lapela ao meio-dia em ponto; linguagens a melros, poupas e outras aves sonda, após regressando. - Está cá um encantamento por aqui! Puxaram p’lo sol todo pra baixo? Ou o sol anda lá p’lo outro lado?
João Cabeçadas: Cruzar mares a todo o risco; e fitar a enseada chegando. - Daniel Pires, diversa ‘entrada’ acrescer ao caos burguês? - Calafate dedilha guitarra sublime, entoa trivial trova. - Carrapatoso, declaradamente ateu, enquanto vai degustando sardinhas, engendra um Glória. - Manuel Bola, calçados voadores sapatos, sustenta surpreendentes actos. - Asdrúbal, a voz cava, mói abisso. - Portugal Silveira pretexta subliminar sucesso pra atirar, a nacos áridos, carónica. - João Calceteiro, porteiro reformado, intervala laboradas oitavas com orientações a estacionamento. - Se pra conquistar-te amor tivesse eu que me morrer, para ser teu desde agora nem nado quisera ser. Como não hei-de te amar? Favo loiro, meu tesouro, sonho claro a despontar. - Achamo-nos, Domingo de Páscoa, numa terra desconhecida. Em casa estranha acolhidos assam-nos peixe no lume do chão pra celebrar o dia. Consigo ligar ao pai e à família distante acertando incrivelmente num número p’lo telemóvel. Acabamos enfim por reunir-nos, ignoremos embora o quanto rondará no cômputo a despesa. Acidentada viagem trouxe até nós a irmã, p’lo Expresso, rasgando ravinas. - Tarde é o copo que bebes cheio ar; noite o sono que dormes amado nada; antemanhã a espera e a certeza; já a manhã os olhos te devolve. - Amacia o coração roupa ajustada; acaricia mãos água lavada; ameiga face o ar da rua; amansa temores a plena lua. - Crê, é dia; os cotovelos fincados na janela. - Meu céu a hora entrada; minha rosa chaga aberta; riso ruivo o gergelim. - Estremadura; seca aragem; campestre paisagem; o bicho, tão calmo, não cabe em si. - Manuel Bocage: Doída eternidade, doido coração, és minha! Zoilos, zarpai! Abraça-me a Rainha! - Granja: Devora noites milenares meigo monstro jacente sobre liteira enorme no aquático fundo. - Burga, dos temíveis raios. - Nazo, feira, pastoso pó, posta, dinheiro grosso. - Torrão, nem uma folha bulindo. - Vontade de explorar aventuroso interior a assoalhada. - Estádio em Braga: Asas a rasgar céu, a arrojados golpes pedra, a escancarar alma. - Nem fiz guerra nem sei guerra. A-M. - Sertã, sobre água límpida corrente. - O indizível completar-se por toda a parte até. - Estou cá, óbvio sobre o solo. - Que mais sacar aos bolsos senão calor? - Vale Manso, completude a olhos dada, fluida miragem. - Sardoal, no alto templo soam aleluias. - Na Herdade do Esporão, sobre relvado, à sombrinha. - Por Janeiro, junquilhos no balseiro. Cedinho, com o aclarar, lilases desbastar. in Périplo Navegante in Sonhadas Palavras in http://angeloochoa.net/
Melrinho fiel, que cedo me visitas, saltitando esvoaçante, a cantarolar cantitos puros absolutos, sílabas dum chão empedrado e turvo na antemanhã liberta das rosas; vou para filmar, e idealizo uns planos picados para acompanhar-te a divagação magnífica, enquanto me deixas por erva húmida, antes dum sol desconhecido.
Queridas graças,
ResponderEliminartudo de bom pra vocês,
que quero dum amor
tamanho quanto o ar.
-
‘A estrela de Belém
é hoje ainda
numa noite escura…’
Dissipe-se ’ora,
com o transluzir cimeiro à gruta,
a vã angústia.
-
Quando o Reino de Deus
chegar de vez,
os padres ficarão desempregados,
o Papa entreter-se-á
um tempo imenso
a fazer bolinhas de sabão.
-
O Cobrador das quotas do CCS
há uns bons anos
que a más horas chega indesejado.
Das prestações dos últimos trimestres
me crava em euros novos à socapa.
Dava-me, entrementes,
a costumado ioga espanhol.
Retirado o bigodado gajo,
em vão leito retomo,
revoltando-me para outro lado.
Ai de mim, que da urdidura
o fio libérrimo não mais reato.
-
A rapariguinha do pub,
entre copos solícita, amaro idílio nutre.
-
Tarefas com o Partido:
Só quando desceu
para ir à reunião,
esperavam-no,
deu conta de que enfiara,
na hora,
o pulôver americano.
-
Boi exausto
os cornos
investe
a delir sonhos
ideais.
-
Filha,
que
a Sírio tua
fulja.
-
Então um muito bom dia com sol por aqui
e com uma muito boa noite pela metade
escura que agora está no outro lado
alfinetada por mil pontinhos luas.
-
Pedrinhas da calçada por onde,
solas gastas, sapatos a arrojos vão.
Abrigam-se-me
sob elas
sumidas visões.
-
A fresca hora,
Yolanda irrompe,
apertando o cinto,
p’lo Café.
Um seu poema me pede,
mas demoro-me a pari-lo pra papel,
ruminante fatal duns versos múltiplos
pra acertar contas a sorrisos.
Se tanto a cansa se compor,
porque não pernoita vestida na praceta,
no aconchego das ignoradas estrelas?
-
Traseiras do Liceu, 4 da manhã:
Como habitualmente, uns dois padeiros apartando
pão em cestos, sacos, carrinhas.
Mas eis que há novidade:
Chegou o grande dia da viagem dos finalistas a Espanha.
Uns madrugadores pais esperam já, mais seu menino,
p’lo autopulman contratado.
Mas o menino está nervoso e mal dormido.
Desloca-se muito de um lado pra outro,
não sabe que fazer dos pés.
Mais pais, mais pais, mais pais e mais paizinhos,
e mais meninos e meninas.
Já não há onde arrumar mochilas, sacos e malinhas.
Basbaques uns, e umas, outros, e outras, fumando,
ou disfarçando pasmos com beijinhos.
Boa antemanhã para o Joaquim guarda-nocturno:
Se está entregue a praceta,
pode por hoje ir mais cedo pra casa.
-
Com modorra vai o tempo.
Alvuras tingindo dia.
Preguiçosas ternuras avançando.
-
Alguém grita dentre silêncio;
estores, seco estampido;
a um carro na via algum cão ladra.
-
À sombra do companheiro no roxo ocaso,
caída sobre rugosa terra, descansadinha,
nutres com sonhos meus devaneios turvos,
dás azo à música que soa p’lo ar nublado,
és carne da loucura que me mantém.
-
Ignorado elo cambiante
espera que se quebre verso?
Som a remexer torpe ouvido?
Melodia não transcrita?
Correnteza extraordinária?
Arrumador de tabacos
na maquineta automática
relata idos com
manguchi independentista.
-
O escriba do olhar abrangente
resolvera acabar letrinhas
e abismar-se.
-
Nas mãos seguro,
o livro a aluna lê,
a resolver-nos.
-
A pomba do Santo ’Spríto
voa-nos da lapela
ao meio-dia em ponto;
linguagens a melros,
poupas
e outras aves sonda,
após regressando.
-
Está cá um encantamento por aqui!
Puxaram p’lo sol todo pra baixo?
Ou o sol anda lá p’lo outro lado?
João Cabeçadas:
ResponderEliminarCruzar mares a todo o risco;
e fitar a enseada chegando.
-
Daniel Pires,
diversa ‘entrada’ acrescer
ao caos burguês?
-
Calafate
dedilha guitarra sublime,
entoa trivial trova.
-
Carrapatoso,
declaradamente ateu,
enquanto vai degustando sardinhas,
engendra um Glória.
-
Manuel Bola,
calçados voadores sapatos,
sustenta surpreendentes actos.
-
Asdrúbal,
a voz cava, mói abisso.
-
Portugal Silveira
pretexta subliminar sucesso
pra atirar,
a nacos áridos,
carónica.
-
João Calceteiro,
porteiro reformado,
intervala laboradas oitavas
com orientações a estacionamento.
-
Se pra conquistar-te amor
tivesse eu que me morrer,
para ser teu desde agora
nem nado quisera ser.
Como não hei-de te amar?
Favo loiro, meu tesouro,
sonho claro a despontar.
-
Achamo-nos,
Domingo de Páscoa,
numa terra desconhecida.
Em casa estranha acolhidos
assam-nos peixe no lume do chão
pra celebrar o dia.
Consigo ligar ao pai e à família distante acertando
incrivelmente num número p’lo telemóvel.
Acabamos enfim por reunir-nos, ignoremos
embora o quanto rondará no cômputo a despesa.
Acidentada viagem trouxe até nós a irmã,
p’lo Expresso, rasgando ravinas.
-
Tarde é o copo que bebes cheio ar;
noite o sono que dormes amado nada;
antemanhã a espera e a certeza;
já a manhã os olhos te devolve.
-
Amacia o coração roupa ajustada;
acaricia mãos água lavada;
ameiga face o ar da rua;
amansa temores a plena lua.
-
Crê,
é dia;
os cotovelos
fincados
na janela.
-
Meu céu
a hora
entrada;
minha rosa
chaga aberta;
riso ruivo
o gergelim.
-
Estremadura;
seca aragem;
campestre paisagem;
o bicho, tão calmo,
não cabe em si.
-
Manuel Bocage:
Doída eternidade,
doido coração, és minha!
Zoilos, zarpai!
Abraça-me a Rainha!
-
Granja:
Devora noites milenares
meigo monstro jacente
sobre liteira enorme
no aquático fundo.
-
Burga,
dos temíveis raios.
-
Nazo,
feira,
pastoso pó,
posta,
dinheiro grosso.
-
Torrão,
nem uma folha
bulindo.
-
Vontade de
explorar aventuroso
interior a assoalhada.
-
Estádio em Braga:
Asas a rasgar céu,
a arrojados golpes
pedra,
a escancarar alma.
-
Nem fiz guerra
nem sei guerra.
A-M.
-
Sertã,
sobre água límpida
corrente.
-
O indizível
completar-se por toda a parte até.
-
Estou cá,
óbvio sobre o solo.
-
Que mais sacar aos bolsos
senão calor?
-
Vale Manso,
completude a olhos dada,
fluida miragem.
-
Sardoal,
no alto templo soam aleluias.
-
Na Herdade do Esporão,
sobre relvado, à sombrinha.
-
Por Janeiro, junquilhos no balseiro.
Cedinho, com o aclarar, lilases desbastar.
in
Périplo Navegante
in
Sonhadas Palavras
in
http://angeloochoa.net/
Melrinho fiel, que cedo me visitas, saltitando esvoaçante, a cantarolar
ResponderEliminarcantitos puros absolutos, sílabas dum chão empedrado e turvo
na antemanhã liberta das rosas; vou para filmar, e idealizo uns planos
picados para acompanhar-te a divagação magnífica, enquanto me deixas
por erva húmida, antes dum sol desconhecido.
(Sonhadas Palavras, 2ª edição, 13.viii.2009)